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Cientistas mapeiam efeitos das "canetas emagrecedoras" no corpo

Cientistas mapeiam efeitos das "canetas emagrecedoras" no corpo

Data de Publicação: 29 de janeiro de 2025 05:55:00 Com base em dados de 2,4 milhões de pacientes com diabetes, pesquisador mapeia a ação dos análogos ao hormônio GLP-1, como a substância semaglutida, e sugere benefícios além da perda de peso. Porém, também há riscos relatados

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Com base em dados de 2,4 milhões de pacientes com diabetes, pesquisador mapeia a ação dos análogos ao hormônio GLP-1, como a substância semaglutida, e sugere benefícios além da perda de peso. Porém, também há riscos relatados

INÍCIOCIÊNCIA E SAÚDE

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 Há benefícios e riscos conhecidos e não reconhecidos anteriormente do GLP-1. É preciso investigar, advertem os cientistas    -  (crédito: Delo Vcusa/Divulgação )

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Há benefícios e riscos conhecidos e não reconhecidos anteriormente do GLP-1. É preciso investigar, advertem os cientistas   - (crédito: Delo Vcusa/Divulgação )

Aprovados em 2017 originalmente para tratar diabetes 2, medicamentos análogos ao hormônio GLP-1 — as famosas "canetinhas que emagrecem" — passaram a ser usados no combate à obesidade e, desde então, mostraram-se promissores para diversas condições. Um estudo publicado na revista Nature Medicine baseado em pesquisas anteriores constatou que, por enquanto, remédios dessa classe podem reduzir o risco de 42 problemas de saúde. Porém, os pesquisadores também encontraram 19 intercorrências. As descobertas baseiam-se em dados de 2,4 milhões de usuários.

Os estudos incluídos pela equipe da Escola de Medicina da Universidade de Washington em St. Louis, nos Estados Unidos, são observacionais, ou seja, não estabelecem uma relação de causa e efeito. Porém, os autores ressaltam que o tamanho da amostra e a quantidade de pesquisas de qualidade usadas na revisão sustentam as conclusões, que devem ser validadas por mais investigações. 

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Em uma coletiva de imprensa transmitida on-line, os autores justificaram o interesse nessas drogas devido à popularidade entre pacientes, médicos e mídia. "Dada a novidade e a popularidade crescente dos medicamentos, é importante examinar sistematicamente seus efeitos em todos os sistemas do corpo — sem deixar pedra sobre pedra — para entender o que eles fazem e o que não fazem", disse o autor senior do estudo, Ziyad Al-Aly, epidemiologista no John J. Cochran Veterans Hospital. 

Mapeamento 

Segundo Al-Aly, a abordagem permitiu construir um "atlas abrangente", mapeando as associações do GLP-1 com todos os sistemas orgânicos. "Os resultados do estudo fornecem visões sobre alguns benefícios e riscos conhecidos e não reconhecidos anteriormente do GLP-1 que podem ser úteis para informar o tratamento clínico e orientar as agendas de pesquisa."

Para o estudo, a equipe avaliou prontuários médicos de pacientes tratados para diabetes entre 1º de outubro de 2017 a 31 de dezembro de 2023. Os pesquisadores compararam as informações de saúde daqueles que utilizaram os GLP-1 com as dos medicados com drogas mais tradicionais. 

De forma geral, os medicamentos análogos ao hormônio GLP-1 foram associados a benefícios significativos para a saúde neurológica e comportamental, com riscos reduzidos de convulsões e dependência de substâncias como álcool, cannabis, estimulantes e opioides. Pessoas que tomaram esses remédios para perda de peso também apresentaram menos probabilidade de ideação suicida, automutilação, bulimia e transtornos psicóticos, como esquizofrenia.

"Curiosamente, os medicamentos GLP-1 agem em receptores que expressos em áreas do cérebro envolvidas no controle de impulsos, recompensa e vício — potencialmente explicando sua eficácia em conter o apetite e os distúrbios de vício", disse Al-Aly. "Esses medicamentos também reduzem a inflamação no cérebro e resultam em perda de peso; ambos os fatores podem melhorar a saúde do cérebro e explicar o risco reduzido de condições como Alzheimer e demência."

O médico nota que, embora as "canetinhas emagrecedoras" apresentem eficácia contra uma ampla gama de problemas de saúde, a magnitude dos benefícios é modesta — cerca de 10% a 20% de redução para a maioria dos resultados. "No entanto, o efeito modesto não nega o valor potencial desses medicamentos, especialmente para condições em que existem poucas opções de tratamento eficazes, por exemplo, demência. Isso também pode implicar que esses medicamentos são mais benéficos quando usados em conjunto com outras intervenções, como mudanças no estilo de vida ou outros medicamentos", observa Al-Aly. 

Três perguntas para: 

Fernanda Silveira, endocrinologista e professora de Medicina da Universidade Católica de Brasília (UCB)

O que explica o amplo espectro de benefícios dos medicamentos GLP-1?

Entre os principais mecanismos que explicam esses efeitos estão a ação central no sistema nervoso, com regulação do apetite e melhora da saciedade ao atuar em áreas específicas do hipotálamo; efeitos cardiovasculares diretos e indiretos; efeitos renoprotetores, incluindo a redução da albuminúria e proteção renal, atribuída à diminuição da pressão intraglomerular e à modulação de processos inflamatórios; ação hepática, com redução da produção hepática de glicose e potencial benefício na esteatose hepática; modulação do metabolismo lipídico, com redução de triglicerídeos e melhora do perfil lipídico. Também há efeitos anti-inflamatórios em diversos tecidos, contribuindo para a melhora de doenças inflamatórias crônicas; e neuroproteção, com estudos indicando possível papel no tratamento e prevenção de doenças neurodegenerativas, como Alzheimer e Parkinson. 

O que deve ser observado ao usar esses medicamentos?

É fundamental monitorar efeitos adversos comuns, como náusea, vômito, diarreia e desconforto abdominal, que são frequentes, especialmente no início do tratamento, sendo que a titulação lenta da dose pode ajudar a minimizar esses sintomas. Atenção também deve ser dada a efeitos adversos raros, mas graves, como pancreatite, cujo risco é aumentado, especialmente em pacientes com histórico prévio da condição; doença da vesícula biliar e carcinoma medular de tireoide, que, embora raro e com estudos predominantes em modelos animais, deve ser monitorado. Além disso, é essencial evitar o uso sem supervisão médica, uma vez que a ausência de retenção de receita pode facilitar o uso inadequado, expondo pacientes a riscos desnecessários. 

Os benefícios e efeitos negativos já estão bem estabelecidos?

Embora os benefícios em perda de peso, controle glicêmico e redução de risco cardiovascular sejam bem documentados, algumas áreas ainda demandam pesquisas adicionais. Estudos em andamento investigam benefícios emergentes, como o papel em doenças neurodegenerativas, doenças hepáticas (MASH) e inflamação sistêmica. Riscos associados ao uso prolongado, como pancreatite crônica e neoplasias, ainda não são totalmente elucidados, assim como a segurança em populações específicas, incluindo gestantes, idosos frágeis e pacientes com comorbidades graves, que necessitam de mais estudos para estabelecer a segurança do uso. 

 Problemas gastrointestinais são comuns

O estudo sobre os benefícios e potenciais riscos dos medicamentos análogos ao GLP-1 confirmou descobertas de pesquisas anteriores detalhando o potencial dessas drogas para reduzir o risco de ataque cardíaco, derrame e outras preocupações cardiovasculares. Porém, os autores também encontraram desvantagens dos GLP-1, incluindo um risco aumentado de problemas gastrointestinais, como náusea, vômito, diarreia e, em casos raros, paralisia do estômago. "Isso foi bem documentado na pesquisa e de forma anedótica", disse Ziyad Al-Aly, epidemiologista no John J. Cochran Veterans Hospital e principal autor do artigo. "Nosso estudo confirmou tais descobertas."

O que é novo, ressalta, são os mecanismos potenciais pelos quais os medicamentos GLP-1 podem afetar negativamente o pâncreas e os rins. "Embora esses efeitos adversos sejam incomuns, eles podem ser muito sérios; os médicos devem estar vigilantes quanto a sinais de pancreatite e monitorar a função renal", ressaltou o epidemiologista. "Os medicamentos GLP-1 podem ter amplos benefícios à saúde. No entanto, eles não são isentos de riscos. Nossas descobertas ressaltam a possibilidade de aplicações mais amplas para esses medicamentos, mas também destacam riscos importantes que devem ser cuidadosamente monitorados em pessoas que tomam essas drogas." 

Alerta

A endocrinologista Deborah Beranger, médica com pós-graduação em Endocrinologia e Metabologia pela Santa Casa de Misericórdia do Rio de Janeiro, ressalta também que esses medicamentos não devem ser usados por questões estéticas, apenas por pessoas com diabetes, obesidade e sobrepeso — nesse último caso, se houver fator de risco associado, como hipertensão. "Pacientes com gordura localizada não devem usá-los, porque essas medicações diminuem gordura visceral, e essas pessoas precisam reduzir mais a gordura subcutânea", explica. 

Para Naveed Sattar, professor de medicina cardiometabólica da Universidade de Glasgow, na Escócia, o estudo publicado na revista Nature Medicine é interessante, mas não deve influenciar as diretrizes clínicas, porque baseia-se em observações que não estabelecem causa e efeito. "Alguns dos benefícios sugeridos foram confirmados em ensaios clínicos randomizados (infarto do miocárdio, derrame, insuficiência cardíaca), enquanto a maioria dos outros requer avaliação futura para confirmar ou refutar", diz. 

Segundo Sattar, o mesmo vale para os riscos sugeridos. "Alguns fazem sentido (por exemplo, mais náusea e vômito) e foram vistos em ensaios, mas muitos outros não", ressalta."Ensaios randomizados em larga escala com terapias baseadas em GLP-1 que produzem maior perda de peso estão em andamento e vários serão relatados em até quatro anos. Esses ensaios nos levarão muito mais perto da verdade." 

 

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