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A potência negra que conquista e inspira histórias na passarela

A potência negra que conquista e inspira histórias na passarela

Data de Publicação: 24 de novembro de 2023 08:46:00 A Câmara Legislativa (CLDF) recebe, hoje, a 18º do desfile de beleza criado em 2012 para combater o racismo, na semana marcada pelo Dia da Consciência Negra. Evento, com apoio do Correio Braziliense, tem entrada franca

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Júlia Eleutério 

 

Produtora de moda e idealizadora do projeto Desfile Beleza Negra em Brasília, Dai Schmidt, 38 anos, encarou dificuldades por conta da cor da pele. Apesar dos desafios e inspirada por outras mulheres negras ao longo da caminhada, a graduanda em psicologia fará, por meio do Instituto OMNI, a 18ª edição do evento hoje, na Câmara Legislativa do Distrito Federal (CLDF), com o apoio do Correio Braziliense.

Dai deu início ao DBN em contraponto à Capital Fashion Week — tradicional semana de moda brasiliense. Após trabalhar como modelo em uma agência e presenciar o racismo, ela viu despertar o interesse por palestras sobre a igualdade racial e eventos de conscientização. Em 2012, Dai realizou o primeiro desfile, na Rodoviária do Plano Piloto, atraindo a mídia e a população. "Sofri muita retaliação, porque fiz algo que pensei que ia apenas chamar atenção para o evento, mas ele teve uma proporção muito maior do que estava no meu alcance naquele momento", recordou.

O desfile, que antes era protesto, foi transformado em um projeto e virou uma marca. "Temos uma história e passamos uma mensagem. O DBN conscientiza as pessoas sobre o tema e chama a atenção das autoridades para que a gente possa falar, sim, sobre o racismo que, em Brasília, é muito forte", destacou. "É preciso mesmo a gente bater de frente. Por isso, esta edição está sendo dentro da CLDF, para chamar atenção das autoridades, que precisam acordar e fazer a diferença", enfatizou a idealizadora.

Como fontes de inspiração, a graduanda de psicologia ressaltou ter aprendido muito com a deputada distrital Doutora Jane e com a advogada Josefina Serra a entender sobre o que é racismo, e que ele realmente existe. As duas foram responsáveis por fazer Dai compreender que precisava estudar e agir para além do desfile. "Vou ser psicóloga porque percebi a necessidade de trabalhar a autoestima da população preta. A Jane foi uma mulher que me incentivou a estudar e a combater essas questões raciais. A Josefina me ajudou muito a crescer. Sou muito grata a ela também por me incentivar a estudar e a evoluir", comentou.

Sem economizar elogios, Dai também destacou a importância de Jorge Guerreiro, 41, seu novo sócio na empreitada, como incentivador de estudo e compreensão no combate ao racismo. "Estou cercada de pessoas que sempre estão me fazendo crescer, então eu não caminho sozinha, tem pessoas também por trás de mim, me ajudando para alavancar muito mais e para conscientizar sobre o tema. Não vamos acabar com o racismo, mas vamos pelo menos minimizar", pontuou.

Na passarela montada no Foyer do Espelho d'Água da Câmara Legislativa, o desfile contará com 30 modelos negros e que não seguem um padrão de estética de corpo. "Escolhemos pessoas comuns. A gente não tem um critério muito exclusivo, como a moda faz a partir do que ela quer vender. É claro que a gente pensa um pouco na ideia do retinto e de peles mais claras, mas a priori são pessoas comuns, para poder tirar essa ideia do profissional e deixar a ideia de que todo mundo pode, inclusive a comunidade preta", detalhou Jorge.

Podcast do Correio

Guerreiro e Doutora Jane, madrinha do projeto, foram recebidos, nesta semana, no Podcast do Correio para falarem sobre a importância do desfile em um local como a CLDF e o combate ao racismo. Em uma conversa com as jornalistas Mariana Niederauer e Thays Martins, os dois também comentaram sobre a necessidade de cotas raciais e políticas públicas para reduzir a desigualdade racial no país, criando oportunidades para a população negra, além da relevância do Dia da Consciência Negra, comemorado em 20 de novembro.

Além de sócio-diretor no Desfile Beleza Negra e engajado na luta contra o racismo, Jorge é ator, com trabalhos no universo do teatro, streaming, publicidade e cinema. Durante o bate-papo, ele comentou que o projeto vem para trazer um novo olhar para a moda da comunidade preta e do pensamento preto, em termos gerais, a partir da estética. "O DBN vem com força para fazer diferença", destacou.

"Este é o Mês da Consciência Negra, então esse desfile é para falar um pouquinho do negro em todos os espaços, inclusive na moda", completou Doutora Jane. Durante o podcast, a parlamentar recordou que conheceu o projeto ainda na primeira edição, há 11 anos, tendo a oportunidade de desfilar algumas vezes. "É uma desconstrução de vários mitos, inclusive aquele padrão estético de beleza que as pessoas conhecem. Tem gente que não consegue se imaginar e se enxergar nos modelos tradicionais, então é trazer gente comum e, especialmente eu acho que tem mais um conceito de dizer que o negro pode estar na moda, que ele é bonito com o tipo de cabelo dele e com a cor de pele", comentou.

Doutora Jane ressaltou que um dos pilares do mandato dela é tratar a questão da negritude. Sendo a primeira mulher negra em 30 anos de CLDF, a parlamentar falou ainda a respeito da representatividade. "Diria que o racismo à brasileira é aquele que todo mundo diz que nosso país não é racista, mas ele está introjetado em cada um de nós, aparece nas frases e algumas pessoas se arvoram a expor isso. Eu vivi tempos em que se usava o termo 'boa aparência', que significava não ser negro", exemplificou.

Jane comentou ainda que há pessoas que tentam minimizar qualquer discussão em torno da questão negra. "Dizem que é mimimi ou choradeira, e eu digo que não é. Só quem de verdade vai entender o que a gente fala é quem tem a pele negra e passa por diversos constrangimentos todos os dias. Eles são tão constantes! Não dá para ficar o tempo todo chamando atenção. A gente percebe o olhar diferenciado", declarou a deputada.

Visibilidade

Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), cerca de 50% da população brasileira é declaradamente negra. No entanto, Jorge e Jane comentaram sobre a busca por pessoas negras ocupando locais de visibilidade. "Você vê poucos. Louvo quando vejo uma pessoa negra em uma novela ou jornal, me sinto representada", destacou a deputada. Para ela, esses espaços estão sendo abertos, "mas ainda não na medida da necessidade para que a gente diga que a população realmente é igual e não é racista".

Em complemento, Jorge afirmou que, embora essa abertura esteja ocorrendo, tem uma ideia de delicadeza da subjetividade de cada personagem. "É muito legal estar na tela e a gente se ver representado, mas tem um discurso que precisa começar a avançar e a pensar sobre essa subjetividade e essa profundidade desse personagem 'o que ele fala para mim?'", comentou o ator. "Acho que quando isso é posto também na mídia, e mesmo na moda, trazendo enquanto sujeito, isso vai para um outro lugar. Tem que estar disponível, tem que estar ali sendo mostrado, mas também tem que ter a sua profundidade", enfatizou o sócio-diretor do DBN. "Até porque não há população que consiga avançar com metade das suas pessoas segregadas", pontuou.

Questionados a respeito da relevância do desfile ocorrer na CLDF, Jorge e Jane destacaram o simbolismo da ação. "A Câmara Legislativa é a casa de todas as pessoas, onde tem todas as representações. Então é simbólico trazer no Mês da Consciência Negra o desfile para a casa do povo. Com certeza vai ter uma repercussão e a gente quer falar do negro em todos os espaços", comentou a deputada, acrescentando que a ideia é que o projeto vá para outras cidades.

Convidando a população, Jorge ressaltou que o desfile de hoje será uma grande obra. "Tem muita música, muita imagem legal, mas o tema é exatamente a gente estar tratando e trazendo o preto, mas não para o lugar do sofrimento. A gente está trazendo beleza tanto nas músicas quanto nas imagens e na estética de forma geral. Vamos ter uma energia girando ali que só vai saber quem chegar", enfatizou.

SERVIÇO

18ª edição do Desfile Beleza Negra

Local: Câmara Legislativa do Distrito Federal (CLDF)

Data: 24 de novembro

(sexta-feira)

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