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Câncer infantil: um grande desafio, mas uma luta de todos

Câncer infantil: um grande desafio, mas uma luta de todos

Desafios e obstáculos norteiam a oncologia pediátrica no Brasil. Apesar dos avanços no tratamento, ter acesso universal a ele ainda é o maior entrave

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Eduardo Fernandes

 

 (crédito: Arquivo pessoal)

(crédito: Arquivo pessoal)

Uma luta complexa, em uma fase que deveria ser sinônimo de leveza e brincadeira. No Brasil, o câncer é uma realidade presente na vida de inúmeras crianças. Drama que já é a primeira maior causa de mortes por doenças no país entre crianças e adolescentes de um a 19 anos, de acordo com dados do Instituto Nacional do Câncer (Inca).

 

Segundo a instituição, 80% dessas crianças e adolescentes seriam curados com o tratamento necessário e o diagnóstico precoce da doença. Porém, são nesses pontos que mora o grande "x" do problema. Neviçolino Pereira de Carvalho, oncologista pediátrico, ressalta que há avanços, mas alguns dilemas, como remédios de alto custo e falta de assistência especializada para auxiliar essas crianças, são grandes entraves.

"Sabemos que alguns tumores existentes são curados somente com quimioterapia convencional. Mas outros, não. E novas imunoterapias, anticorpos biclonais, monoclonais e terapia alvo chegam com um preço muito alto no mercado", explica.

 

Muitos desses medicamentos possuem comprovação científica de que seu impacto aumenta, sim, a chance de cura desse grupo. Entretanto, ainda não estão disponíveis no Sistema Único de Saúde (SUS). No Brasil, há toda uma regulamentação para a inclusão dessas novas terapias. Etapas e prazos que precisam ser cumpridos corretamente, desde a fase inicial, que é o reconhecimento e a autorização da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).

Desafios

Depois desse primeiro passo, é preciso, ainda, que a Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no Sistema Único de Saúde (Conitec) faça a avaliação do medicamento para reconhecer seu impacto e eficácia no paciente. Em seguida, um dos pontos principais é analisado e posto à prova: como distribuir o insumo pelo SUS. "Esse processo pode durar até um ano", afirma Neviçolino.

 

De concreto no cenário em relação a possibilidades de terapias, há várias formas de extrema importância. Em especial da leucemia linfoide aguda (LLA) — tipo de câncer presente no sangue e na medula, capaz de afetar os glóbulos brancos, e o mais comum na infância. "Esse é muito necessário, principalmente nos casos em que os pacientes não respondem aos primeiro tratamento ou naqueles em que houve o controle da doença, mas o indivíduo acabou recidivando", detalha

O medicamento mencionado por Neviçolino é o Blinatumomab, imunoterápico considerado por muitos profissionais como um dos grandes avanços da medicina nos últimos anos. "Essa nova terapia revolucionou o cenário porque é uma medicação que, quando utilizada, consegue controlar novamente a doença. E conseguindo isso, temos como consolidar a remissão com o transplante de medula", descreve.

A cura

O Blina, já presente no Brasil na rede privada, busca o seu total acesso por meio do SUS para que mais crianças sejam ajudadas. Uma dessas tantas espalhadas pelo país com diagnóstico de LLA é Raíssa Batista, 12 anos, que descobriu a doença em julho de 2020. A princípio, como relata a mãe, Rosania Batista, 35, os sintomas eram dores de barriga, que aumentavam gradualmente ao longo dos dias.

As duas, que vivem em São Paulo, logo correram para o médico com a pequena, pensando que se tratava de algo bem simples. Depois de várias semanas à espera do resultado, ele, enfim, veio. "Era leucemia. Quando o diagnóstico dela chegou, foi devastador. Você não imagina passar por isso, muito menos o seu filho. É uma doença muito difícil", conta Rosania.

 

Um período complicado, ainda mais por ter outra filha pequena, de 2 anos. Mesmo assim, diz que recebeu um suporte maravilhoso da família durante todo o processo de tratamento. Com a iminente dificuldade de auxílio, dada a dimensão da doença, encontrou, em uma associação para crianças e adolescentes com câncer, chamada Tucca, um lugar com equipe de enfermagem, médicos e ums ótima estrutura para acompanhar Raíssa.

Lá, mãe e filha tinham tudo o que precisavam para ir em busca da cura da garota. Tratamentos diários, quimioterapias e muitas consultas. "Os efeitos da doença foram devastadores. Minha filha até parou de estudar. Ela foi uma guerreira", relembra.

Apesar dos contratempos durante a quimioterapia, a primeira semana de Raíssa foi muito positiva, como recorda Rosania. Ela era forte e corajosa, segundo a mãe. Depois de quase três anos, hoje, a pequena está curada. E vive como uma criança deve viver: feliz. "Graças a Deus a Raíssa se recuperou e está de alta. Desde então, não há mais nenhum remédio que ela tome."

Local de acolhimento

Há 40 anos atuando na oncologia pediátrica, o médico Sidnei Epelman, ao lado da esposa, tinha um sonho que se concretizou há 25 anos: cuidar de crianças e adolescentes. Esse propósito fez com que a Tucca nascesse. "Na vida, temos que fazer aquilo que acreditamos. Tive várias inspirações ao longo do caminho, em especial com os meus mentores nos Estados Unidos", afirma.

 

Desde então, esse é o caminho no qual escolheu apegar-se. E, até o momento, analisa que tem sido uma missão e tanto, já que fazer a diferença é tudo o que Sidnei sempre quis. Por vários anos, dividiu esse desejo com a esposa, Cláudia, que veio a falecer anos atrás. Para ele, é necessário oferecer a melhor chance de cura para crianças e adolescentes.

"Conseguimos fazer programas que ajudam as crianças que nos procuram no nosso hospital, na Zona Leste de São Paulo. Alguns exames sofisticados, que não são cobertos pelo SUS, também somos capazes de fazer", acrescenta. 

 

SAIBA MAIS

 

Esperança

Pedro Paulo Queiroga, 17, diagnosticado com meduloblastoma em junho do ano passado, é um dos beneficiados. A mãe, Janice Queiroga, 45, precisou largar tudo na Paraíba, em razão dos grandes problemas que estavam enfrentando. "Meu filho apresentou sintomas que pareciam gástricos. Após diversos exames, foi sugerida uma ressonância de crânio, onde descobrimos um tumor na fossa posterior", conta.

 

Com isso, foi necessário implantar uma válvula para sanar a pressão intracraniana, causada pelo acúmulo de líquor, impedido de circular devido ao tumor. Logo no início da descoberta, fizeram a cirurgia para a retirada. Um mês depois, o resultado de meduloblastoma surgiu, para susto da família.

De acordo com a pedagoga Janice, o filho era jovem demais para passar por aquilo. Mesmo assim, a família não se desesperou e se uniu em uma rede de apoio que ajudou o jovem nessa difícil jornada. "Falando de efeitos físicos, ele teve perda profunda da audição do lado esquerdo e está com diminuição do equilíbrio no momento", comenta.

As consequências foram impactantes e graves. O tratamento de câncer não foi fácil, segundo Janice. Debilitou e mudou toda a estrutura do lar, já que precisam sair do Nordeste para encontrar o abrigo necessário na Tucca. O retorno, até o momento, tem sido positivo.

Após as sessões de radioterapia, não se vê mais a doença. Hoje, Pedro faz, apenas, ciclos finais de quimioterapia para encerrar o tratamento. "Posso dizer que ele está curado! Estamos aqui há 10 meses, ele ainda tem uns cinco meses até finalizar", completa a esperançosa mãe.

 

Cenário local

Em Brasília, há um espaço reconhecido pela sua importante presença no tratamento de crianças e adolescentes. O Hospital da Criança de Brasília (HCB) é referência nesse auxílio dado ao público infanto-juvenil na capital do país. Simone de Castro Rezende, coordenadora técnica responsável pela implantação do serviço de TMO na unidade, reitera a importância de assistir de forma adequada esses pacientes.

Embora o cenário da oncologia pediátrica no Distrito Federal não seja tão animador, usa desse obstáculo para fazer um bom trabalho no HCB, mesmo sem ajuda direta do governo quando o assunto é obtenção de fármacos. "O hospital consegue fazer uma economia para adquirir verba suficiente na compra da medicação. Mas, é lógico, isso deveria ser uma questão de saúde pública", aponta.

Para a médica, isso não deveria ser uma responsabilidade de cada hospital. E, sim, das autoridades governamentais, que deveriam fornecer os remédios necessários. O ideal é que todos tenham esse acesso, independentemente da condição financeira. No entanto, este é um assunto um tanto complexo, como descreve. Isso porque as crianças também não têm tempo suficiente para esperar. "O importante, agora, é a nossa união", finaliza.

Tipos mais comuns de câncer:

— Linfomas
— Leucemias
— Tumores de sistema nervoso central

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